Carlos Henrique Machado Freitas
Em síntese o que a economia criativa quer são os recursos do Estado para produzir uma bolha, um artifício que sustente o ambiente turvo de água remexida ande o barro se levanta e o jogo fica confuso.
Os artifícios utilizados nesse processo para justificar a absoluta falta de resultados é tangenciar e produzir múltiplas caras e formatos, criar uma bula farta de hermenêuticas e conceituar cada obstáculo que consiga ampliar as questões em torno da cultura até tirá-la do foco. Por isso essa incontrolável paixão pelo universalismo multicultural. E o que eles querem do Ministério da Cultura? Que ele seja um banco 24horas para o saque a fundo perdido usando suas senhas sociais e políticas. Ao ministro, seja Gil, Juca e quem mais vier. O que se espera é que ele seja um pidão, um caça-níquel na esfera ministerial. Casou a grana na mesa, o ministério deve se emudecer e deixar que a terceirização vá às compras.
O Estado, melhor dizendo, o governo não deve governar, deve sim buscar recursos, um, dois, três por cento, se possível cem por cento e, ainda assim, não será o bastante.
Essa associação que beira à chantagem do investimento grosso nas mãos dos promotores privados da cultura nacional é uma das coisas mais escandalosamente mentirosas e deploráveis deste país.
Estamos, dia após dia, vendo o vazio completo que esse sistema fraudador produziu. O vício é tão anacrônico que a grande crise do setor cultural no mundo, praticamente não é mencionada. Todo discurso da economia criativa está confeitando um bolo que não mais existe. Esse confete está sendo desenhado em cima de uma caixa de papelão, dentro, um paralelepípedo e, de longe, veremos quem vai chutar a caixa e tropeçar.
É transparente que a economia criativa é um projeto de exclusividade social, é um arranjo de elaboração funesta, aonde publicitários de boas relações sociais e comerciais, fazem um supletivo de marketing cultural, coisa que ninguém sabe, e atropela carreiras de profissionais que se qualificaram e dedicaram parte de suas vidas a uma profunda investigação acadêmica sobre a cultura brasileira.
A economia criativa tem como bíblico um mantra da teoria da dependência usada em larga escala pelo Sr. Fernando Henrique Cardoso, um Estado mínimo no gerenciamento e imenso na distribuição de favores ao setor privado. Governo que produziu enormes gastos e uma péssima qualidade de serviços, detonando, sobretudo, as garantias trabalhistas, com sua frase sentenciadora, “o fim da era Vargas”.
A economia criativa nada mais é do que empresários falsários, na grande maioria, vendendo um futuro que jamais chegará, mas que nos revela uma realidade dura de conseqüências ainda não medidas e que subordina profissionais altamente graduados no universo das artes a um patrimonialismo privado, a uma odisséia de sofismas e ao apelo barato das catarses ameaçadoras.
Tudo isso, toda essa chantagem é um insulto à nossa inteligência. A nossa cultura, a nossa base estrutural se valeu de sentimentos, da ordem natural das coisas. A cultura, as artes não são marionetes empresariais, não se movem para frente e para trás ao gosto de manetes. Esse jogo perverso não está substanciado em nenhuma realidade do passado, nem do presente, que fará do futuro, ele é apenas um jogo caça-níqueis.
Estou farto desse jogo intimidatório, desse ensaboado conceito de economia criativa. Eu faço parte de um exército de famintos abandonados nesse deserto, vendo grandes artistas brasileiros jogados ao desânimo. Pessoas gabaritadas são entregues a uma aceitação pueril e são jogadas na sarjeta pelos defensores das medidas organizacionais que flutuam na distribuição de recursos, mas são absolutamente concretos, inclusive em percentuais dos ganhos que querem obter do Estado.
Esses números apresentados, em grosso modo, pela economia criativa são de uma falsidade incomensurável, é uma mironga, um bate-entope percentual sacudido numa betoneira e servido como banquete de inclusão cidadã. A economia da cultura é um caixote de fundo falso, não tem números concretos para apresentar, carteiras assinadas, valorização profissional só biscate. Fazem campanha contra a ampliação do Estado que tem como critério a exigência de concursos, de qualificação, de diplomas e não cursinhos de meia-bomba. E depois que o Estado estiver fraco, pálido, anêmico, apontam-lhe o dedo e o chamam de inoperante, lento e burocrático. Para quê? Para se fartarem na ciranda das terceirizações e quarteirizações, aonde os pares da sociedade dominante trocam figurinhas e favores.
Em breve teremos um novo Ministro da Cultura de um novo governo, e podem anotar que
os ataques ao ministério continuarão como tática para ampliar os ganhos do setor privado. Vivemos aqui fora uma tourada, um salve-se quem puder e, no meio de tudo isso, os saqueadores da economia criativa usam e abusam de suas ferramentas sociais e políticas para enxergarem na escuridão, com seus binóculos infravermelhos os objetos mais valiosos de suas catanças.
Esse mundo da economia criativa não tem ventre, não há fecundação capaz de produzir algo que se pareça com um mercado responsável e produtivo de arte. Fartam-se de panfletos, frases, slogans, de promessas jamais cumpridas e ameaças.
Espero sinceramente que as pessoas que há anos lutam pela cultura brasileira recobrem as suas forças e, sobretudo, examinem os resultados, de A a Z, desse falso abecedário e que retomem a alegria, a energia e que possam reconstruir o que essa praga de gafanhotos chamada ironicamente de economia criativa proporcionou à cultura brasileira.
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